A derrota bolivariana nas eleições da Venezuela



O ano de 2015 se encerra com um grande revés para a esquerda venezuelana. As eleições legislativas realizadas em 05 de dezembro mudaram o cenário político, dando uma inédita maioria para a oposição. O futuro do bolivarianismo se apresenta ameaçado.

A conjuntura adversa que vinha se aprofundando no último período mudou o caráter desta eleição. Não se tratou de uma simples disputa pelos 167 assentos da Câmara, mas ganhou um caráter quase que “presidencial”, dada a importância que adquiriram tanto para o chavismo, quanto para a direita.


Realizada quase três anos após a morte de Hugo Chávez, o governo do presidente Nicolás Maduro enfrenta um contínuo processo de desgaste, motivado tanto por fatores conjunturais, quanto por erros políticos. Ainda que muitos desses erros de Maduro e do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) na condução da política interna venezuelana pós-Chávez sejam graves, como a incapacidade de absorver as demandas de setores médios e as dificuldades em lidar com os setores extremistas da oposição, eles por si só não explicam o revés eleitoral. A crise da economia venezuelana é um grande fator a ser levado em conta neste momento.

O agravamento da crise econômica mundial colocou a Venezuela em uma situação de grande fragilidade e recessão. A queda dos preços do petróleo, que despencaram de 100 para 30 dólares, impactou profundamente as receitas do país. A situação de verdadeira “Guerra Econômica” que tomou conta do país, acabou atingido a todo o conjunto da população. Além da inflação ter disparado nos últimos anos e da retração no PIB, o país petroleiro importa 70% dos produtos que consome, e com a falta de dólares para importações, a escassez de produtos básicos é grande. Agravada pela ação do contrabando de itens pelos chamados “bachaqueros” e pela disseminação de práticas de locautes.

Esta crise enfraqueceu a força do bolivarianismo, que não tem conseguido construir uma narrativa de mudança deste quadro. As respostas apresentadas até o momento por Maduro tem sido insuficientes ou ainda não lograram êxito. Com a capacidade econômica do Estado enfraquecida, não tem tido meios diretos para ações com maior impacto.

2016 deverá representar um ponto de virada na trajetória da chamada Revolução Bolivariana. Se nas eleições de 2010 as forças ligadas ao chavismo conquistaram 100 cadeiras no parlamento, contra 53 do MUD (Mesa da Unidade Democrática, coalizão de partidos opositores) naquelas que formam as primeiras das quais a oposição participou da disputa desde a nova Constituição, o quadro agora se inverte. No mínimo 99 deputados legislarão pela MUD e 46 pelo Grande Polo Patriótico, liderado pelo PSUV, além de pouco mais de uma dezena de deputados independentes ou eleitos pelas comunidades indígenas.

Esta nova maioria poderá impor importantes derrotas e até mesmo colocar em xeque o futuro do governo Maduro e da Revolução Bolivariana. Já com votos suficientes para aprovar emendas na constituição, se chegar a ultrapassar a barreira de 111 deputados, a MUD terá maioria para convocar uma nova Constituinte.

As semanas que seguirão serão decisivas para definir os contornos finais que este novo cenário terá. Uma mudança já facilmente observada é como o discurso da mídia internacional se modificou no trato das eleições da Venezuela. Anteriormente chamada de “ditadura”, com a vitória da direita, ninguém questionou a legitimidade deste pleito. As críticas estridentes cederam espaço para verdadeiras celebrações do resultado, disfarçadas de “cobertura isenta”.

O futuro da esquerda venezuelana ainda está por se definir, em sua trajetória, reveses e adversidades foram quase que uma constante. Mas esta talvez tenha contornos ainda mais dramáticos e decisivos. Nicolás Maduro, em sua primeira fala após o anúncio dos resultados, afirmou que o momento se trata de uma “bofetada” no chavismo. Se saberão encontrar forças para se reerguer desta bofetada e superar a derrota, é um cenário em aberto e plenamente possível. O PSUV e o governo Maduro terão que passar por rápidas mudanças para enfrentar o novo cenário. Mecanismos de resistência para eventuais ações regressivas do parlamento opositor existem, mas a questão de fundo passará por superar a crise econômica, equação de difícil solução.

Um comentário:

  1. O problema venezuelano é a forte dependência das receitas do petróleo para fazer frente à importação de insumos básicos. Deveriam ter aproveitado a década de bons preços do petróleo para instalar uma indústria de insumos básicos e alimentos, que dessem conta do consumo interno e criasse bases para exportação.

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