Mudanças climáticas ameaçam existência humana na África



“As consequências negativas das mudanças climáticas ameaçam o desenvolvimento e a própria existência dos seres humanos na África. A população, os ecossistemas e sua biodiversidade única serão grandes vítimas” do fenômeno. A declaração do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) demonstra a preocupação do organismo com o continente que contém 54 países e população de aproximadamente 1,2 bilhão de habitantes.
“Nenhum continente sofrerá um golpe tão severo em razão das mudanças climáticas como a África”, afirma o Pnuma, com sede em Nairóbi, no Quênia. Outras organizações internacionais são igualmente contundentes a esse respeito. Por exemplo, com base na análise do IPCC (Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudanças Climáticas), o Banco Mundial confirmou que a África será a região mais vulnerável do mundo aos efeitos negativos do aquecimento global.

Na África subsaariana, os eventos climáticos extremos farão com que as áreas secas sejam mais secas e as úmidas mais úmidas, a agricultura sofrerá a perda de cultivos e as enfermidades se espalharão para maiores altitudes, afirmam especialistas do Banco Mundial. Também alertam que, até 2030, cerca de 90 milhões de pessoas mais poderão ficar expostas à malária, “o maior assassino na África subsaariana”.

Essas e outras terríveis conclusões não são novas para os especialistas do Banco Mundial. De fato, há cinco anos, alertaram que a temperatura média nesse continente subiu meio grau Celsius no último século, e que a temperatura anual média, provavelmente, aumentará entre 1,5 e quatro graus até 2099, segundo os últimos dados do IPCC.

Agricultor de subsistência do Zimbábue mostra milho deformado que cresceu em seu campo nos arredores de Harare
Especialistas do Pnuma explicaram que, por sua posição geográfica, o continente africano é particularmente vulnerável devido à “consideravelmente limitada capacidade de adaptação, exacerbada pela pobreza generalizada e falta de desenvolvimento”.
Alguns dos fatos que constam da ficha descritiva Mudanças Climáticas na África, O Que Está Em Jogo?, elaborada pelo Pnuma graças à colaboração do IPCC são surpreendentes:
– até 2020, estima-se que entre 75 milhões e 250 milhões de pessoas na África poderiam sofrer estresse hídrico devido às mudanças climáticas;
– até 2020, a produção agrícola que depende das chuvas poderia diminuir em 50% em alguns países;
– a produção agrícola, que inclui o acesso aos alimentos em muitos países africanos, poderia ser severamente comprometida, o que agravaria a insegurança alimentar e exacerbaria a má nutrição;
– até o final do século 21, o aumento do nível do mar poderia prejudicar áreas costeiras baixas com grandes assentamentos humanos;
– até 2080, poderiam aumentar entre 5% e 8% as terras áridas e semiáridas na África, segundo diversos cenários climáticos;
– o custo das medidas de adaptação poderia ficar entre 5% e 10% do PIB (Produto Interno Bruto).

Manifestação em defesa de um desenvolvimento sustentável. Foto: Pnuma.

O capítulo africano do informe do IPCC sobre projeções climáticas para a região confirma esses dados e oferece alguns outros destaques importantes.
Temperatura: até 2050, o aumento da temperatura na África poderá ser, em média, de 1,5 a três graus Celsius, uma tendência que continuaria após essa data. Em todo o continente, o aquecimento muito provavelmente será maior que a média global anual e todas as estações apresentarão regiões subtropicais mais secas do que os trópicos úmidos.
Ecossistemas: estima-se que, até 2080, a proporção de terras áridas e semiáridas na África aumentará entre 5% e 8%. Os ecossistemas são fundamentais porque contribuem significativamente para a biodiversidade e o bem-estar dos seres humanos. Entre 25% e 40% das espécies de mamíferos dos parques nacionais da África subsaariana estarão em perigo. As evidências mostram que o clima modifica os ecossistemas naturais de montanha por meio de complexas interações e respostas.
Precipitações: também haverá grandes variações nas tendências anuais e estacionais das chuvas, bem como eventos extremos de inundações e seca. As precipitações anuais provavelmente diminuirão em grande parte da costa africana que margeia o Mediterrâneo e no norte do Saara, com grandes possiblidades de diminuírem as chuvas na medida em que se aproxima do mar.
Secas: até 2080 projeta-se um aumento de 5% a 8% das terras áridas e semiáridas, segundo vários cenários climáticos. As secas se tornaram mais comuns, especialmente nos trópicos e nas zonas subtropicais desde a década de 1970. A saúde humana, já comprometida por numerosos fatores, poderá se agravar devido às mudanças e à variabilidade climáticas, especialmente a malária na África austral e nas terras altas da África oriental.
Água: até 2020, entre 75 milhões e 250 milhões de pessoas poderão sofrer maior estresse hídrico pelo aquecimento global e, até 2050, seriam entre 350 milhões e 600 milhões. A variabilidade e as mudanças climáticas exercerão uma pressão adicional sobre a disponibilidade, as possibilidades de acesso e a demanda de água na África.
Agricultura: até 2020, a produção dos cultivos dependentes da chuva poderá diminuir em até 50% em alguns países. A produção agrícola, que inclui o acesso aos alimentos em muitos países africanos, poderá estar severamente comprometida. Isso prejudicará mais a segurança alimentar e exacerbará a má nutrição. A renda do setor poderá cair em 90% até 2100, sendo os pequenos produtores os mais prejudicados.
Aumento do nível do mar: a África tem cerca de 320 cidades com mais de dez mil habitantes e aproximadamente 56 milhões de pessoas, segundo estimativas de 2005, em zonas costeiras baixas, a menos de dez metros de altitude. Até o final deste século, a elevação do nível do mar poderá afetar as zonas costeiras baixas com grandes assentamentos humanos.
Energia: o acesso à energia é severamente limitado na África subsaariana, com cerca de 51% da população urbana e 8% da rural conectada à rede elétrica. A extrema pobreza e a falta de acesso a outros tipos de combustíveis faz com que 80% da população africana recorra à biomassa para cobrir suas necessidades domésticas. Essa fonte representa 80% da energia consumida na África subsaariana. Outros problemas como a urbanização, o aumento da demanda por energia e a volatilidade dos preços do petróleo agravam a situação energética no continente.
Outra preocupação da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) é a ameaça que o aquecimento global representa para a produção agrícola. “As mudanças climáticas surge como uma das grandes ameaças ao desenvolvimento agrícola na África”, destaca. E acrescenta que a cada vez mais imprevisível e irregular natureza dos sistemas climáticos no continente constituem uma carga adicional para a segurança alimentar e o sustento rural.
“A previsão é que a agricultura sofrerá uma parte significativa do dano causado pelas mudanças climáticas”, ressalta a FAO. O setor sofrerá períodos prolongados de secas e/ou inundações durante o fenômeno El Niño/La Niña. A pesca será particularmente prejudicada pelas mudanças na temperatura do mar, o que reduzirá a produtividade entre 50% e 60%.
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Publicado originalmente por IPS/Envolverde

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