Foto de Beata Czyzowska Young |
O ano de 2015 não deixará saudades, pelo menos para a imensa maioria dos viventes. Nosso mundo segue um lugar violento, desigual e marcado por uma irracionalidade estrutural travestida de discurso racional. Não é um fenômeno novo, mas sua persistência inabalável espanta, mesmo que fissuras existam e a resistência, ainda que enfraquecida, jamais tenha deixado de ocorrer.
Para nós
brasileiros foi um ano especialmente ruim, tão ruim que por vezes
temos dificuldades de perceber alguns dos contornos principais do que
está acontecendo no mundo que nos cerca.
Se olharmos para a
economia veremos, por exemplo, que os reflexos prolongados da crise
econômica deflagrada em 2008 persistem, com os mesmos “remédios”
equivocados sendo adotados em larga escala. O exemplo dramático da
Grécia mostra como os fundamentos geradores da crise não só não
foram atacados, como persistem como a “única alternativa
possível”. O mais dramático é que esta ideia, mesmo que com
variações, hoje não sofre questionamento algum no interior do
centro do poder político global. A ideia da “austeridade”, do
“ajuste fiscal”, do “estado mínimo” e outras cantilenas
seguem amplamente hegemônicas.
Obviamente, a crise
na economia não é um fenômeno isolado do Brasil e mais um punhado
de países, pelo contrário. As ilhas de bonança, em um mundo em
recessão, são cada vez mais raras, devendo ser tratadas com a sua
devida excepcionalidade e não como a regra.
Não apenas na
economia tivemos um ano ruim mas em quase qualquer área que se foque
não será difícil constatar que o saldo do ano é negativo, afora
pontualidades no plano individual ou de pequenas coletividades. Os
conflitos armados pelo mundo seguem com força, o “fantasma” do
terrorismo ganhou um novo impeto em 2015 e tornou-se uma questão
ainda mais complexa de ser confrontada. Os ataques em Paris
aparentemente não serão os últimos a espalharem o medo no
continente europeu, as reações das nações ocidentais seguem os
mesmos velhos equívocos em lidar com o mundo árabe. A entrada da
Rússia no conflito com o ISIS na Síria representa um fator novo,
mas ainda não está claro se terá capacidade de alterar o curso
dramático dos acontecimentos. Os sinais apontam como pouco provável,
devendo se prolongar a escalada de violência na região, assim como
sua potencialidade irradiadora para outros cantos.
Não pretendo aqui
seguir com um longo balanço retrospectivo do ano de 2015, pincelei
algumas coisas e acrescentarei ainda poucas outras apenas para
esboçar um quadro geral. Lembranças imediatas de um ano ruim. A
sensação de que estamos vivendo no limite do “pior dos mundos”
é recorrente, na verdade, se observarmos atentamente, temos apenas
anos ruins alternados por anos ainda piores. A “humanidade”, este
ente abstrato que representa a coletividade das pessoas que habitam
este planeta, jamais vivenciou anos plenamente “bons”, pelo menos
desde que o capitalismo é o sistema dominante no mundo. Por
honestidade, contudo, devesse reconhecer que antes do capitalismo
tínhamos outros tantos problemas, mas cuja escala é incomparável,
assim como suas prolongadas consequências.
Mas voltando ao ano
de 2015, não vou pormenorizar nossos problemas locais, o olhar agora
é para o mundo. Sobre o Brasil comentarei noutro momento. Tivemos
este ano a 21ª Conferência do Clima (COP 21), ainda que muitos
esperançosos acreditavam que após tantos desastres ambientais a
assolarem o globo alguma mudança mais significativa poderia se
concretizar, não foi o que ocorreu. Verdade que conseguiu-se obter
um acordo, mas os limites de seu alcance são tão flagrantes, que é
difícil alguém, com sinceridade, apontar que mudanças na escalada
predatória sobre o meio ambiente irá ter algum avanço no curto ou
médio prazo.
No plano político,
tem chamado a atenção o avanço do conservadorismo e de forças
situadas no âmbito da direita. A vitória de Macri na Argentina, o
crescimento de forças nacionalistas em diversos parlamentos entre
outras, ampliam a sensação de um processo inequivocamente
regressivo. O paradoxo é tamanho que a mensagem do Papa Francisco,
neste deserto conservador, acaba se revestindo de um claro sentido
progressista. Quem imaginaria, a pouco tempo atrás, que teríamos na
figura do Papa uma das principais vozes críticas no mundo?
Se o início desta
década foi marcada por novas manifestações e ativismos que tomaram
as ruas, como o 15-M na Espanha, o Occupy nos EUA, a chamada
“primavera árabe” e etc, seu saldo global não é muito
animador. Fora o exemplo espanhol com a consolidação do Podemos
como uma nova força política mudancista, no geral, pouco se avançou
em novas formas de reorganizar as aspirações populares. Como ponto
singular neste panorama geral, talvez o grande fato que 2015
registrou é o avanço da reaproximação entre Cuba e os EUA,
possibilitando um caminho para o fim do cruel embargo que à décadas
flagela a ilha.
São tantas as
questões que seguem em aberto, que não me parece loucura afirmar
que 2015 não irá terminar, ou melhor, 2016 não será uma ruptura,
mas um prolongamento deste mesmo ano ruim. Apesar disso, gostaria
aqui de fechar com uma mensagem de esperança, tão necessária para
nos mover e impedir que a apatia nos assole frente a tantas
adversidades. Esperança que pode se sustentar em elementos que nos
permitem projetar algumas mudanças no cenário, mesmo que pontuais.
As lutas sociais ao redor do globo nunca deixaram de existir e nem
deixarão. Elas podem não ganhar os devidos holofotes da grande
mídia e serem silenciadas pela narrativa dominante, mas em algum
momento se farão notar, e quando isso ocorrer, não faltará aqueles
que ficaram espantados, afinal, na normalidade da irracionalidade
dominante, tudo que foge do roteiro é negado e visto como
impossível. Mas o impossível acontece, afinal, o possível apenas
se repete.
Que 2016 seja melhor que esse ano horroroso!
ResponderExcluirAbraço e feliz ano novo para vc!
Suelen